Sempre estou às voltas com viagens inesperadas e acontecimentos inusitados, mas em viagens, passeios e ocorrências durante noites e madrugadas, o que se pode esperar? E desta vez há uma série de acontecimentos, alguns previsíveis outros não.
Nossa viagem se inicia em Alto Tabocas, exatamente naquele trevo em que se deixa a pista asfáltica para seguir-se a Tabocas, Caldeirão para findar-se em Várzea Alegre. Parece-me que vinha no sentido de Itarana a Santa Teresa. Poderia estar vindo, também, de Santa Maria de Jetibá. Isto não importa. Importante mesmo é a história que se inicia a partir deste local e deste momento, assim: Neste trevo, havia um grupo de jovens mulheres vestidas com roupa branca e exibiam faixas e repetiam refrões de alguma música, convidando para que as pessoas que trafegavam pelo local fossem assistir a um espetáculo encenado por mulheres num grande circo instalado na localidade de Várzea Alegre.
Não foi causa do convite, mas a partir desse momento enveredei-me pela serra de Tabocas, descendo até Caldeirão de São José, sucessivamente chegando a Várzea Alegre. Embora me parecesse sem motivação; mesmo assim, o primeiro local que visitei em Várzea Alegre foi um circo que havia instalado, onde fora, antigamente, o campo do Volante Futebol Clube. Era, realmente, um grande circo, pelo menos era grande a lona que cobria extensa área do antigo campo.
Convidaram-me a que entrasse para assistir gratuitamente um ensaio, em que o proprietário do circo exercitava declamações de poesias, cantigas populares, exercícios em trapézio e ensaiava algumas mulheres para executarem danças próprias de países do leste europeu, região de procedência do empresário. Essas mulheres representavam para a “Troupe do Grand Cirque” as artistas cuja publicidade era feita em Alto Tabocas. Ah, sim! Antes que me esqueça: o principal artista era dono da organização e, ao mesmo tempo, palhaço, equilibrista e malabarista. Assisti alguns ensaios e me retirei do local.
Saí do circo e vi que alguém garimpava pedras preciosas nas proximidades, tanto no antigo campo como nos terrenos de quintais de casas edificadas nas proximidades. Era Clementino Scotar que lavrava com duas possantes máquinas, uma das quais, moderna escavadeira e a outra fazia o trabalho de peneiramento das terras de modo a separar cascalhos e possíveis gemas preciosas, especialmente as valiosas águas-marinhas. Assim que cheguei ao garimpo, Antônio Morao me dizia:
- Pague aos seus garimpeiros. Eles estão, há vários dias, aguardando pelo pagamento. Caso você não tenha dinheiro disponível, eu lhe empresto algum, pois recebi uma diferença resultante da minha aposentadoria e posso disponibilizá-la ao amigo.
Estranho. Não entendi por que tinha que pagar garimpeiros se já não cuido do ramo há algum tempo, mas Clementino e Anízio de Barros reclamavam:
- Foi bom você ter vindo, estamos necessitando repor coisas do nosso barraco e você há tempo, não nos paga!
Pensei: deve haver algum engano, Preto é que é sócio de Clementino. Eu fui convidado a associar-me, mas declinei do convite. Devo falar com Preto para dissipar esse mal entendido. Fui procurar meu cunhado Alfeu, que responde pela alcunha de “Preto”, procurando esclarecer o caso, assim:
- Preto você é o único sócio de Clementino e eles estão me cobrando algumas parcelas de participação nas despesas do garimpo cujo responsável é você. Vi que Preto não estava nos melhores dias, aparentava péssimo humor e me respondeu:
- Realmente sou o sócio de Clementino no Garimpo, mas não se lembra que quem paga é você, meu compadre! Procure regularizar logo esses pagamentos em atraso para que eles possam continuar com a lavra.
Voltei a Clementino para pedir-lhe mais algum prazo, pois teria que vir a Santa Teresa para levantar recursos em banco. Perguntei a Clementino se estava tendo resultados nessa lavra e ele me exibiu uma pedra de água-marinha límpida com aproximadamente vinte quilogramas de peso, dizendo-me que eles poderiam alcançar bom resultado com a venda dessa gema. Apesar de tudo, ele não sinalizava que eu tivesse participação nesse resultado. Só assim, pude entender que, na realidade, eu não era sócio de coisa alguma. Minha participação consistia em apenas na obrigação de pagar aos garimpeiros; o verdadeiro sócio era Preto, que nada pagava, deixando esses encargos exclusivamente para mim, que não tinha quaisquer direitos; apenas obrigações. Essa que era minha parte. Lembrei-me que, às vezes, sócios de garimpo existem somente para pagar, por que não são lembrados quando são encontradas as gemas preciosas.
Quem disse que esse tipo de sociedade é fruto de sonhos? Pesadelos é que são. Melhor numa ora dessas é acordar de verdade.
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