sábado, 6 de setembro de 2008

COMEMORAÇÕES E MAIS COISAS

Estivemos reunidos com vários casais num hotel na Praia da Costa, comemorando algo importante, talvez algo ligado à minha atividade de Auditor da Receita Federal do Brasil, neste caso, sob o patrocínio de duas entidades às quais somos filiados – a ANFIP, abrangendo todo o Brasil e a ANFIPES, onde são inscritos quase a totalidade dos auditores ativos, inativos e pensionistas do Estado do Espírito Santo.
Diariamente, havia palestras num centro de convenções, encontros em restaurantes famosos, desses que servem, entre outras coisas, a moqueca capixaba, tornada famosa devido aos ingredientes especialmente produzidos nesta terra – peixes, mariscos, condimentos e o modo como é preparada. Há uma coisa que costumam dizer os apreciadores da iguaria: “moqueca é capixaba; as outras são peixadas”. Certamente, este prato preparado com peixes e mariscos da água salgada e alguns de água doce dos caudalosos rios que cortam nosso território. Para nós capixabas não há dúvida de que é a melhor preparação do gênero – dizem que isto é coisa de “puxar a brasa para a própria sardinha”
Acredito, mesmo, que o evento que ocorria era congresso de auditores fiscais, e durante os dias em que isso ocorreu, várias autoridades, desde ministros, governadores, deputados, senadores, prefeitos e vereadores, tanto se fizeram presentes como alguns proferiram discursos e palestras. Dentre os congressistas palestrantes, havia um casal tornado nosso amigo, que costumava ocupar assento nas mesas em que eu e minha esposa ocupássemos. Tornamo-nos amigos e, chegando ao final do evento, sentiríamos falta de sua companhia. Foi na despedida que ofereci uma aguardente produzida no Estado – a cachaça “Da Mata”. Aquele senhor me disse:
- não posso tomar cachaça, pois sou alérgico a produtos feitos com cana-de-açúcar.
Ofereci-lhe outra bebida destilada, que transportava comigo, estendendo-lhe um copo onde existiam botões, clipes, grampos e outras miudezas, uma das quais se movia. A esposa desse meu amigo exclamou:
- barata!
Não sei se, de fato, era barata, mas o bichinho se movia através de centenas de perninhas. Logo, poderia ser uma centopéia. Quem sabe?
Eu disse apenas:
- Nem, mesmo, depois de lavado este copo, deve ser usado. Sei lá se este animal contém alguma substância tóxica? Nunca se deve arriscar. Leve apenas a garrafa e beba seu conteúdo em outra ocasião. Desculpe-me, não entendo como isto veio parar aqui. Mas esta ocorrência deixou-me constrangido. Isto não podia ter ocorrido com pessoa, que tornada amiga, merecia minha consideração.
O evento comemorativo foi encerrado com um coquetel em reunião solene onde todos os participantes presentes foram convocados para participarem, inclusive, de discursos diversos sobre a temática do congresso.
Mal tudo terminou, os participantes se dispersaram, cada um tomando seu caminho de destino. Eu, saindo à rua, fui abordado por um policial militar, de uma corporação especializada em trânsito, assim:
- senhor queira, por favor, se identificar!
Identifiquei-me e o policial explicou-me:
- o senhor sabe conduzir veículos?
Respondi-lhe:
- sim, mas minha habilitação classe amador se encontra vencida há meses.
- Isto não é problema, pois se trata de emergência: motoristas em greve abandonaram coletivos repletos de passageiros e, antes que ocorra caos generalizado, estamos requisitando quaisquer pessoas do povo para, emergencialmente, conduzir estes coletivos. O senhor acaba de ser requisitado para conduzir este aí.
Apontou para um grande auto de cor azul e me entregou a direção do veículo, dizendo:
- Pode acionar a máquina e dar partida que eu o acompanho para lhe mostrar o caminho a ser seguido.
Não tive alternativa, fiz de acordo com a ordem recebida do policial e percebia que havia vários passageiros, dentre os quais idosos e crianças. E na primeira parada, uma senhora parecendo demonstrar desespero entrou no coletivo e de lá retirou uma criança, justificando:
- desculpem-me esta é minha filha! O irresponsável do meu marido a abandonou aqui e saiu para beber com “amigos de copo”!
O policial autorizou que ela retirasse a criança que dizia ser sua filha, mas aconselhou-a a se dirigir à delegacia de polícia mais próxima e registrar um “BO” – Boletim de Ocorrência. Orientando:
- Senhora, isto é coisa grave! Caso de polícia mesmo! Preste queixa para que esse seu marido seja punido exemplarmente. Onde já se viu um pai abandonar uma criança e ir beber com amigos?
Não sei o desfecho daquele caso porque a mulher pegou a criança e saiu rapidamente do local. E eu ia conduzindo aquele ônibus com maestria. Não é que eu parecia ser mesmo condutor profissional de coletivos. Até o policial não economizava elogios:
- olha não podia imaginar que o senhor, apesar de dizer que só conduzia pequenos autos na condição de amador, me saiu melhor que a encomenda!
E eu ia adiante, parando o coletivo para o desembarque e embarque de outros passageiros; tive que desviar de buracos na pista, fazer paradas bruscas para não atropelar pedestres, atravessar uma pista de chão de terra repleta de lama. Num desses locais, tive que tirar o carro de um atoleiro, de marcha à ré. Nessa manobra, quase colidi com o carro em que viajava aquele casal, feito amigo naqueles encontros em que havíamos participado neste e em dias anteriores.
Não sei se houve greve de motoristas e cobradores no transporte coletivo, mas, enquanto isto, eu continuava a conduzir aquele ônibus azul durante o dia, à tarde, à noite e madrugada afora. Não tenho lembrança de que tenha encerrado meu trabalho, se é que realmente trabalhei. Não sei mesmo como fiz tudo isto sem sequer me levantar da cama.

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